Por Pedro Martins
Zii & Zie é resultado de uma evolução natural de seu antecessor, Cê. Se Caetano Veloso ainda experimentava texturas e procedimentos criativos em seu lançamento de 2006, aqui, o compositor parece ter chegado, finalmente, à fórmula desejada. Os chamados “transambas” equilibram harmonias sofisticadas, construções minimalistas e arranjos impecáveis, além do ótimo desempenho da “banda Cê”, ainda melhor no quarto ano da parceria com Veloso.
O disco inicia com a minimalista “Perdeu”, construída a partir de uma célula rítimica e dois acordes que se repetem ostensivamente. Em seguida, “Sem Cais” traz versos diretos em um formato simples e objetivo. “Por Quem?” é uma canção intimista e bastante peculiar, que se destaca pela evolução melódica. “A Cor Amarela” é um “transamba” por definição, apresentando ousadia poética, boa progressão harmônica e composição rítimica pouco usual. “Tarado” é uma canção formalista, em que o mote da poesia é refletido explicitamente nos elementos musicais. Por outro lado, há momentos menos interessantes, como a lúgebre e rasa “A Base de Guantânamo” e as simplórias “Lobão Tem Razão” e “Falso Leblon”. Além disso, a leitura de “Incompatibilidade de Gênios”, de João Bosco e Aldir Blanc, mostra-se exaustiva e pouco interessante. Já o samba “Ingenuidade”, de Serafim Adriano, recebeu boa interpretação. Aludindo à célebre canção “Menino do Rio”, a bem escrita “Menina da Ria” merece destaque pela conjugação inteligente e equilibrada de harmonia e melodia. O belo tema de “Lapa” salta aos ouvidos prontamente, e se torna ainda mais agradável quando acompanhado pela ótima poesia da canção. Encerrando o disco, “Diferentemente” constitui uma espécie de manifesto da estética híbrida de Zii & Zie, propiciando a confluência do samba com uma poesia repleta de imagens tropicalistas: o indizível que se divisa entre tantos céus, ou ainda, Madonna, Osama e Condoleezza em cores brasileiras.
O resultado de Zii & Zie pode ser atribuído, em grande parte, ao projeto “Obra em Progresso”, que consistiu em apresentações semanais de Caetano Veloso e sua banda com o intuito de revelar ao público os bastidores do processo de criação. A essa iniciativa se devem a sonoridade particular e o desempenho brilhante da “banda Cê” no disco, fator fundamental para a realização de sua proposta estética.
De certa forma, Zii & Zie pode ser entendido como um disco essencialmente tropicalista. Ao longo de suas treze faixas, o samba o pop e o rock se confundem em uma síntese bem planejada que apenas ratifica a consistência do trabalho de Veloso.