Como era de se esperar, Marcelo Camelo vira a página do ótimo Sou (2008) sem medo de começar do zero, a sina do artista. O próximo capítulo, Toque Dela, foi marcado pela mudança do compositor para São Paulo, onde passou a viver com a esposa, a jovem cantora Mallu Magalhães. Esteticamente, o fator geográfico se provou fundamental: enquanto Sou exprime, de maneira intimista, um Rio de Janeiro saudoso e acolhedor, Toque Dela é mais tenaz e expansivo, traduzindo a experiência do indivíduo na metrópole. O trabalho com a canção ficou aquém do disco anterior, alternando momentos simplórios e demasiado intricados. No entanto, o capricho nos arranjos merece destaque, tornando a audição, ainda assim, recompensadora.
A primeira canção a ser divulgada pelo autor foi “Ôô”, de caráter tão simples quanto sugere o título, um bom convite ao ouvinte. Os melhores momentos ficam por conta de “Acostumar”, “Pra te Acalmar” e “Tudo que você quiser”. A abertura, “A Noite”, também merece atenção pela boa melodia e pelas variadas nuances do arranjo. Além disso, a escolha de “Despedida” para o repertório, canção anteriormente gravada por Maria Rita, mostrou-se adequada à atmosfera do disco, recebendo uma boa leitura de seu autor. Contudo, o compositor não obteve o mesmo sucesso com as canções mais ambiciosas. “Três Dias” é, musicalmente, confusa e, poeticamente, fraca, o que se evidencia pelo deslocamento do acento tônico em “Minas Gerais”, justamente o nome do estado que a canção pretendeu homenagear. “Pretinha” inicia repentinamente, e os saltos abruptos da melodia se alternam com trechos de monotonia. “Vermelho” peca pela longa duração, apesar do interessante material musical. Finalizando o disco, “Meu Amor é Teu” é uma radicalização do príncipio de simplicidade aplicado a canções como “Ôô” e “Pra te Acalmar”, sob o risco de tropeçar no simplório.
Assim como acontece no disco anterior, os arranjos de Toque Dela são muito bem construídos. A sonoridade do Hurtmold continua a definir a estética das canções, e Camelo também contribui significativamente com seu violão e sua guitarra. Por outro lado, o desempenho vocal do compositor deixou a desejar em alguns momentos, principalmente em trechos constituídos por grandes saltos visando notas altas.
Toque Dela evidencia a disposição de Marcelo Camelo para o trabalho com o novo, além de ratificar o compromisso do artista com a unidade estética de seus discos. A julgar pelo ciclo de canções, Toque Dela não possui a qualidade de Sou. Ainda assim, trata-se de um álbum sério, bem acabado e, portanto, merecedor de uma audição atenta.