Por Pedro Martins
Segundo disco da parceria entre Caetano Veloso e o produtor estadunidense Arto Lindsay, Circuladô supera seu antecessor, Estrangeiro. Com arranjos mais encaixados e canções melhor acabadas, o disco conta com a participação de figuras importantes como Milton Nascimento, Gilberto Gil, Haroldo de Campos e Jaques Morelenbaum.
“Fora da Ordem” é poeticamente instigante e possui um bom material musical. “Circuladô de Fulô” é construída a partir de um poema de Haroldo de Campos, musicado de forma minimalista por Veloso., que também contribui com um ótimo desempenho vocal. A bela melodia de “Itapuã” salta aos ouvidos, ainda que a canção não impressione. Da mesma forma, “Boas Vindas” é alegre e ritimada, apesar de seu conteúdo pautado em formas gastas. “Ela, Ela” é uma faixa experimental que remete ao trabalho do compositor em Araçá Azul. “Santa Clara, Padroeira da Televisão” traz um bom material musical, além da poesia de temática instigante, em defesa da televisão. “Baião da Penha” é uma boa leitura da canção de David Nasser e Guio de Morais. À maneira de “Boas Vindas”, “Neide Candolina” se destaca pela rítmica latente e pela presença vocal de Veloso. “A Terceira Margem do Rio”, parceria com Milton Nascimento, é uma boa surpresa, trazendo diversidade melódica e harmônica, além de romper com a tendência demasiado expansiva do disco. “O Cu do Mundo” parece orientar-se apenas pela irreverência poética, restando um material musical pouco interessante. Fechando o disco, “Lindeza” é mais um exemplar da estética bossa-novista, que tanto influenciou Caetano Veloso. Ainda é possível encontrar, nesta faixa, um fragmento da bela “Lua, Lua, Lua, Lua”, do disco Jóia, de 1975.
Livre da parafernália de timbres e efeitos que tomou conta de Estrangeiro, Circuladô possui sonoridade mais limpa e bem definida. O violão de Veloso volta a ganhar destaque, e é acompanhado, em muitas faixas, por diversos instrumentos de percussão: dos convencionais pandeiro, surdo e repique a outros menos usuais, como pratos, facas e “paus de Maculelê”. Contudo, ainda é possível notar a presença de guitarra, teclado e efeitos eletrônicos, como no bom arranjo de “Fora da Ordem”.
Circuladô parece chegar mais próximo do ponto de equilíbrio entre o dado local – representado por pandeiros, congas e pelo inseparável violão – e a relevância universal das canções de Veloso, que se aconchegam perfeitamente às guitarras e efeitos eletrônicos de Lindsay. Faltou, de fato, um melhor conjunto de canções. Ainda assim, Circuladô abre um caminho promissor, e Veloso dá mais um passo à frente na carreira.