Quando Ben Harper participou da faixa “Burning Hell” do álbum “The Best of Friends” de 1998 de John Lee Hooker, quem tocava harmônica na mesma faixa era Charlie Musselwhite, na época Hooker sugeriu que os dois músicos poderiam fazer uma parceria para um show ou disco, diante de tanta química que essa gravação gerou entre Harper e Musselwhite.
Mas foi somente agora que os dois conseguiram finalmente sincronizar agendas e se encontrarem em estúdio para gravar o álbum que se transformou em “Get Up!”. Produzido pelo próprio Ben Harper e mais uma vez usando com banda de apoio os músicos do Relentless7 com quem já vem tocando desde o excelente álbum “White Lies for Dark Times” de 2009.
Apesar de o álbum estar creditado a dupla “Harper & Musselwhite”, “Get Up!” é um trabalho em que as canções foram compostas por Ben Harper e outras em parceria com Jason Mozersky e Jesse Ingalls (respectivamente guitarrista e baixista do Relentless7), mas Charles Musselwhite tem papel essencial nos arranjos das musicas, fazendo com isso justiça a parceria dele no álbum.
Com certeza a parceria com Musselwhite fez muito bem a Harper, fazendo-o a sair da sua zona de conforto e não o deixando produzir outro álbum como o fraco e morno álbum anterior “Give Till It's Gone” de 2011. Harper se entrega de corpo e alma, colocando tudo de si em cada frase que canta e em cada nota que tira de sua guitarra/violão que aliada à harmônica de Musselwhite fazem esse CD ser marcante e prazeroso de ouvir desde a primeira audição.
Do início com a acústica e amarga “Dont Look Twice” que é ao mesmo tempo um aviso e um desabafo, passando por músicas mais pesadas como “I’m in I’m Out And I’m Gone” que tem um batida forte da guitarra fazendo um contraponto com a Harmônica de Charles Musselwhite que dá um sentido mais dramático ao final de cada frase cantada por Ben Harper e na quase Zeppeliana “I Dont Believe A Word You Say” que pode muito bem ser endereçada tanto a uma amante, quanto a Políticos e pessoas falsas que estão espalhados por todo lado.
Em “I Ride At Dawn” com uma letra atemporal bem ao estilo do Bob Dylan que fala do papel do homem nos problemas do mundo, destaque para o Slide acústico matador de Harper e esta é a única faixa que não conta com a harmônica de Musselwhite no álbum. No Blues elétrico “Blood Side Out” bem ao estilo de John Lee Hooker, temos a fria inspiração para a violência urbana que nos tira muito mais do que a vida e sonhos.
“We Cant End This Way” traz um coro bem Gospel que junto ao brilhante Slide de Harper fazem dessa faixa um ponto alto do CD. “You Found Another Lover (I Lost Another Friend)” tem uma frase bem sacada para momentos de duvida ou sofrimento “We've been living as if life is over /When it has only just begun” (Estamos vivendo como se a vida fose acabar / Quando ele está apenas começando ).
Na faixa Titulo “Get Up!” com uma letra que evoca os tempos da luta dos direitos civis nos Estados Unidos dos anos 60, tem a Harmonia de Musselwhite fazendo uma segunda voz, que junto ao marcante baixo tocado por Jesse Ingalls deixam a faixa bem viva e direta. “She Got Kick” tem um riff que lembra um pouco “Dizzy Miss Lizzy” de Larry Willians, que também compartilha um pouco das referencias sexuais da segunda e é outra faixa bem animada que não deixa o ritmo do álbum se perder.
“All That Matters Now” fecha o CD de forma lamentosa e cansada onde a Charles Musselwhite faz sua Harmônica quase ser a voz principal de uma música que parece ser cantada por uma pessoa que chega ao final de um dia duro, cheio de solidão, desespero, lamento, sexo, alegria, culpa, perdão, tudo aquilo que cada uma das musicas de “Get Up” nos diz, mas termina com uma frase de conforto “But we're together /And that's all that matters now” (Agora estamos juntos /E isso é tudo o que importa agora) nos preparando para um novo dia , um novo amanha .
“Get Up !” é um disco cheio de referencias ao universo do Blues, e mostra também que os temas e os motivos já cantados a mais de um século continuam relevantes e presentes na vida diária de cada um de nós. E Ben Harper sendo um dos músicos mais significativos dos tempos atuais, com esse trabalho ao lado da lenda Charles Musselwhite, consegue reverenciar o passado sem deixar de ter uma perspectiva do futuro que sua musica pode chegar, criando novas bases para um Blues contemporâneo e fazendo desse álbum um novo patamar na sua carreira.