Por Anderson Nascimento
Lançado em 2007, "Memory Almost Full" teve as suas primeiras gravações antes de seu antecessor "Chaos and Creation in The Backyard", que Paul gravou com a produção de Nigel Godrich. Neste álbum Paul parece querer soar mais pop e mais alegre, o que efetivamente leva-nos a associar o alto astral do disco com um "levanta, sacode a poeira, e dá a volta por cima" em relação à sua conturbada separação de Heather Mills.
Essa sensação de alegria musicalmente falando passada por "Memory Almost Full", na verdade pode ser analisada de várias formas. A julgar pelo repertório extremamente saudosista que se refugia na infância de Paul, para apresentar os melhores momentos do álbum. Esse clima de falsa alegria é claramente entregado já na abertura do disco. "Dance Tonight", o primeiro single do álbum, teoricamente é uma música que deveria sugerir que o ouvinte se esbaldasse de tanto dançar. Mas o que se percebe, no entanto, são notas melancólicas que trazem um certo clima de "vamos deixar tudo isso pra lá, e tentar aproveitar a noite", tanto que as notas da parte instrumental onde ouvimos o solo, são de teor tenso, até o momento da entrada do ukelele usado frequentemente por Paul nos últimos anos.
Depois disso, agora sim sentimos vontade de dançar, como o próprio Paul faz no clipe do segundo single do álbum "Ever Present Past". Trata-se de uma canção com batida e letra aceleradas que, pela primeira vez no álbum refere-se à infância de Paul McCartney. Essa referência à infância de Paul fica marcada com o medley composto pelas canções "Vintage Clothes", "That Was Me", "Feet in the Clouds" e "House of Wax", aonde cada uma dessas canções vai se interligando, formando um bonito mosaico de lembranças do pequeno Paul em Liverpool. Ao contrário da comparação com o medley do Abbey Road dos Beatles, essas canções, mesmo fazendo parte desse medley, possuem vida própria, até porque não se trata de canções não acabadas. "Vintage Clothes" possui uma levada pop assoviável, "That Was Me" é um rockabilly ao estilo Carl Perkins, "Feet in the Clothes" traz um bonito arranjo vocal e um refrão de fácil assimilação e, finalmente, "House of Wax", balada no piano com atmosfera pesada rasgada por um solo de guitarra matador, que só de lembrar já causa arrepios! Após essa maravilhosa sequência, Paul dá uma "pisada de bola" com "End of the End", onde ele tratou de escrever uma espécie de manual de instruções para quando ele "partir dessa pra melhor", desnecessário, pois a canção quebra o clima do disco. Mas até nisso Paul é brilhante, pois alguém tem alguma dúvida de que essa música vai tocar no dia em que ele for embora?
Além desses grandes momentos descritos, Paul ainda é capaz de criar mais dois clássicos de sua carreira solo. Trata-se de "Only Mama Knows" e "Gratitude". A primeira, um Rock estradeiro arrasador, tem sido presença obrigatória nas recentes apresentações ao vivo de Paul McCartney, sempre com uma pegada roqueira capaz de levantar e sacudir todos na platéia. A segunda, "Gratitude", é uma canção ímpar na carreira de Paul, com um misto de música negra e baladão, o velho Macca solta a voz, criando uma interpretação marcante dessa canção que possivelmente foi escrita para a sua ex-mulher.
"Memory Almost Full" é um grito de libertação lançando um olhar para trás e buscando inspiração na infância, que exorciza seus demônios com Rocks pesados, inclusive encerrando o disco com um chacolejar de cabeça em "Nod Your Head". Esse álbum prova que não foi a toa McCartney deixou a crítica impressionada e agradou aos fãs com mais um belo disco de sua gloriosa carreira.