Por Thais Sechetin
Diz a mitologia que a fênix é uma ave que se lança ao fogo quando perde suas forças e se refaz, ressurgindo das próprias cinzas, ainda mais forte, bela e poderosa.
Pra quem ainda não sacou a analogia, vamos expor o cenário do AC/DC antes do lançamento do seu novo álbum, o 17º trabalho da banda chamado Power Up, ou simplesmente, PWR UP:
Antes da turnê de Rock Or Bust, em 2014, o baterista Phil Rudd se envolveu em problemas sérios com a justiça, sendo substituído por Chris Slade. A mesma turnê quase foi cancelada na sua reta final, quando Brian Johnson apresentou grande perda de audição, sendo substituído por Axl Rose. Já o baixista Cliff Williams em 2016 alegou também não estar com a saúde em dia e anunciou sua aposentadoria após a turnê. Para finalizar a péssima maré, no dia 18 de novembro de 2017, morre guitarrista e co-fundador do AC/DC, Malcolm Young. Três semanas antes disso, no dia 22 de outubro, faleceu o mais velho dos irmãos Young, George Yong, que produziu vários álbuns da banda.
No funeral de Malcolm, os membros do AC/DC voltaram a ter contato e antes de gravarem um novo álbum, enquanto Brian tratava de sua audição, Angus vasculhou o baú da banda e encontrou músicas escritas por ele e por Malcolm na época do Black Ice, em 2008. Na metade de 2018 e no início de 2019 o aconteceram as gravações com os membros da banda mais o sobrinho de Malcolm e Angus, o Stevie Young. O lançamento e a turnê desse novo trabalho foram adiados por causa da pandemia de COVID-19, mas de acordo com Brian, eles estão ansiosos para voltar aos palcos.
Power Up foi lançado dia 13 de novembro e já é um dos álbuns mais comentados em 2020. É a essência do puro Rock’n’Roll em tempos modernos. O AC/DC não muda seu estilo habitual de riffs curtos e poderosos, da voz de Brian e dos refrãos perfeitos para estádios lotados. Mesmo sem mudar sua essência eles não são enjoativos ou repetitivos, apenas ficam melhores. Brian tem razão quando disse em entrevista que o responsável na Sony Music em escolher os singles terá bastante trabalho, pois todas as faixas tem potencial para isso.
Com 12 faixas, PWR UP foi produzido por Brendan O'Brien, que produziu os dois últimos discos do AC/DC, fora vários álbuns de Rock bem sucedidos nas últimas décadas (principalmente nos anos 90), e foi gravado no Warehouse Studio, em Vancouver, o estúdio de propriedade de Bryan Adams e onde foi gravado o três últimos álbuns do AC/DC. Brian Johnson não gravou os vocais junto com a banda, mas procurou cantar da melhor forma possível cada letra que era passada para ele, com a ajuda dos toques e dicas de O'Brien.
O álbum começa com a força de “Realize”, que é perfeita para abrir shows de uma nova turnê. A gente sente como se a banda fosse de fato, uma fênix bem sarcástica dizendo em alto e bom som (literalmente) que não está morta.
Já “Rejection” é a música bem estilo AC/DC, com aquele riff inconfundível da banda e com sua letra que é puro rock'n'roll.
O primeiro single do álbum é “Shot In The Dark”, com um refrão fácil de gravar e um ritmo menos agressivo quando comparado às duas primeiras. Nela a gente percebe que com o passar do tempo a voz de Brian fica mais harmoniosa. O título um pouco atrevido é uma referência ao costume da banda de sempre beber umas doses pela noite. O som fez parte da trilha sonora do anúncio de uma partida da MLB e isso não é de se estranhar, pois essa que vos escreve também o usou de brincadeira como trilha sonora em um lance durante as finais da NBA. E encaixou direitinho!
Em “Through The Mists Of Time”, o AC/DC usa um pouco mais da melodia, mesmo sem perder o peso e a essência Hard Rock .A letra fala sobre a passagem do tempo, como uma retrospectiva da banda,e mesmo sendo escrita quando Malcolm ainda estava vivo, ela parece ser a homenagem mais clara ao guitarrista, mesmo sabendo que cada nota foi criada em homenagem a ele no disco todo .Pensando mais uma vez em shows de arena (e no quanto estamos carentes disso), a música tem tudo para ser um hino!
Já chegando na metade do disco, “Kick You When You're Down” é outro refrão de se cantar a plenos pulmões em um show, somado a uma guitarra bem classic rock. Com backing vocal no refrão, letra agressiva, solo de guitarra e uma forte linha de baixo aliado à bateria, esse é um dos sons mais completos do disco. E pra quem tem saudade de uma introdução com um riff estilo “For Those About To Rock”, não há motivo para aflição pois “Witch's Spell” cumpre bem o papel, embora essas duas não sejam músicas parecidas .Talvez essa seja a mágica do AC /DC (ou o feitiço, sendo mais exata).
“Demon Fire” é uma música bem rápida , mas mesmo assim o vocal de Brian não se perde. É onde as guitarras de Angus e Stevie conversam muito bem. Já “Wild Reputation” e “No Man’s Land “mantém a linha Hard Rock do disco sem muitas surpresas e “Systems Down” fala sobre sistemas caindo em uma reação em cadeia. Seria um reflexo de nossos tempos?
PWR UP chega em sua fase final com “Money Shot”,onde mesmo que o refrão muito pareça com o típico diálogo que envolve o clímax de um filme pornográfico ,Angus jura que o nome não foi intencional. A última faixa, chamada “ Red Code”, talvez não vire um single,ou entre no setlist de shows, mas conta com solo de guitarra muito bem elaborado e ao estilo AC/DC: curto e poderoso, além de uma base de guitarra que o próprio Brian adora.
Em síntese, PWR UP é uma homenagem a Malcolm assim como Back In Black foi uma homenagem a Bon Scott e talvez seja por isso que os dois álbuns sejam tão parecidos. Faça o teste de ouvir os dois na sequência, e perceberá duas coisas: que o AC/DC faz puro Rock que transcende as barreiras do tempo, e se tem uma banda que é a verdadeira representação de uma Fênix envolta em chamas, sempre pronta para ressurgir cada vez mais poderosa, essa banda é o AC/DC.