Por Guilherme Cruz
MM3 é um disco urgente, sendo gravado em três dias, a banda Metá Metá trouxe uma cornucópia de influências multiculturais, sons que fundem diversas linguagens e uma visão de mundo que nos leva ao caos e à lama dos pecados humanos. O sangue dos dentes que maldizem a vida aqui são exacerbados. Na voz de Juçara Maçal, não há escapatória, ela nos obriga a ver o rosto feio da humanidade, e por fim, nos obriga a olharmos a nós mesmos, pelo espelho de seu canto.
Na introdução pungente da música "Três Amigos" descortina-se diante de nós o espetáculo caótico que a banda nos reserva. Como a música alerta "Uma esperança morta pra lá/ Uma ferida aberta pra cá" vai nos colocar neste mundo jazzístico e assustador que pulsa ao longo do disco.
A banda encarna num alter ego que se perde e sofre neste cenário liquefeito e cruel. "Angouleme" conta a história de uma personagem que "Chora enquanto ri, faz careta/ Grita um verso a quem passar". Mas um pressagio infeliz profetizado na canção "A Imagem do Amor" traz "Uma beleza, sem rosto/ Sem nome, sem moderação" no corpo de uma criança que nasce em meio ao caos sonoro e real deste universo que treme de medo, pois "A imagem do amor/ Não é para qualquer um". Diante de caminhos barrados, temos que seguir rumo ao incerto, restando-nos pedir aos nosso orixás que nos ensinem a caminhar, como é cantado na canção "Mano Légua".
No entanto, a força que temos para continuar é um mistério esboçado em "Angolana", onde "A gana de voar/ A fome de mirar/ O horizonte" que nos domina e nos impulsiona tem origem em algum lugar desconhecido. E deste desconhecimento que habita a tudo, "Corpo Vão" questiona algo extremamente importante. Em um mundo que se destrói por seus próprios pecados, o que nos impede de nos destruirmos juntos à ele? Num lugar em que "Uma faca/ No ar/ Faz o certo/ Virar/ O errado" como podemos nos manter íntegros?
"Ossanyn" versa sobre o senhor das folhas e o poder da natureza. Em língua africana, essa canção vem buscar a salvação para nossos erros nos braços sempre abertos da mãe natureza. Numa letra que brinca com os sons das sílabas, "Toque Certeiro" mostra a urgência e o movimento dos amores que procuram estar juntos num mundo de encontros e desencontros, quando o estar com alguém pode ser a única coisa sólida na vida.
"Oba Kosso" é a apoteose mais dilacerante possível. Novamente cantando em língua africana, a canção traz Xangô, o orixá da justiça, para redimir a humidade de seus horrores. Numa peça jazzística de quase dez minutos, o disco MM3 não poderia ser encerrado de forma mais visceral, dando forma a desolação que impera.
Neste disco, que mistura jazz, rock, sonoridades africanas e a dor do mundo, Metá Metá explode de forma intensa sua mensagem, nos puxa pelas mãos para o abismos que se abre sob nossos pés e nos empurra neste buraco sem fim que é urgência da vida.