Por Valdir Junior
Depois de um longo tempo, vinte e três anos, Keith Richards lança seu terceiro álbum solo “Crosseyed Heart”, mais uma vez contando com o auxilio luxuoso dos X-Pensivos Winos, banda que conta, encabeçando as posições principais, seus amigos Steve Jordan (bateria), Waddy Wachtel (guitarra) e o saudoso, saxofonista, Bobby Keys, falecido em dezembro de 2014, entre outros, nessa que segundo Keith é a “segunda” melhor banda do mundo que ele juntou.
Mesmo estando esse tempo todo, ocupado com discos e turnês dos Stones, entre outras coisas, Keith demorou demais para fazer o sucessor de “Main Offender” (1992), isso acabou deixando os fãs ansiosos, e de certa forma resignados, mas Keith, como um bom vinho, tem o seu próprio tempo para que as coisas aconteçam e possam ser apreciadas.
O álbum foi gravado num dos intervalos de turnê dos Stones, e é conseqüência direta da experiência que Keith teve de escrever e lançar o seu autobiográfico livro “Vida” em 2010. Steve Jordan também foi parte fundamental nesse processo, ajudando e preparando o terreno no estúdio para Keith, e sendo seu parceiro nas composições de grande parte das canções do álbum.
A faixa titulo “Crosseyed Heart” que abre o CD, é um blues acústico, onde Keith, sozinho ao violão e com sua voz rouca, paga tributo Robert Johnson, a faixa é até curta, mas o tempo parece parar quando a escutamos. Daí em diante Keith nos oferece doses generosas de Rock and Roll (“Trouble”, “Heartstopper”, “Blues In the Morning” e “Amnesia”), Reggae (“Love Overdue” de Gregory Isaacs), Soul Pop (“Something For Nothing”), Country (“Robbed Blind”), pitadas de Jazz nas baladas (“Suspicious”, “Illusion” que tem a participação de Norah Jones), e mais Blues (“Goodnight Irene” de Leadbelly). Tudo isso embalado na guitarra safada, malandra e cheia de ritmo de Keith.
No seu já citado livro “Vida”, Keith conta que foi aceito pelos músicos jamaicanos, dentro do seu restrito circulo de música, justamente porque estes reconheceram nele uma “alma negra” embaixo de uma pele branca, e é justamente isso que percebemos e sentimos a cada nota, frase de guitarra, levada de baixo e bateria em todas as músicas de “Crosseyed Heart”, uma alma e um coração que perpetuam as raízes culturais que de uma forma ou outra interligam todos os homens até o inicio dos tempos.
Se havia alguma dúvida que Keith Richards é a alma e o coração musical dentro dos Stones, essa dúvida foi dissipada quando Keith lançou seu primeiro álbum solo “Talk Is Cheap” em 1988, e agora com “Crosseyed Heart”, Keith reafirma tudo isso, num álbum que pode não trazer nada de novo, repete alguns clichês, como bom discípulo de Chuck Berry, mas é cheio de sentimento, espontaneidade, jovialidade e alegria, tudo aquilo que qualquer um de nós precisa ouvir e viver para continuar caminhando nessa terra de tempos difíceis e matadores.