Por Tiago Meneses
Eu sempre acho até engraçado quando imagino um quase desconhecido Mike Oldfield de apenas 19 anos perambulando de gravadora em gravadora para que uma delas o ajudasse a lançar seu álbum com apenas duas faixas, sendo cada uma com mais de 23 minutos de duração. Imagino as pessoas perguntando, "e você toca o que meu jovem?" Tendo como resposta vinda por parte do rapaz e de maneira lacônica a seguinte frase: Toco quase todos os instrumentos.
Acontece que depois de muitas rejeições (que ele esperava passar, obviamente) ele encontrou Richard Branson, que com sua nova gravadora (Virgin Records) estava disposto a apoiar o projeto ambicioso e catalogá-lo com o número V2-001, o primeiro álbum lançado pela Virgin Records.
"Tubular Bells" não é o melhor álbum da história da música, o mais complexo, ou o mais espetacular, mas não me entendam mal, é um álbum fantástico e eu o vejo como uma obra-prima, mas o mérito real e com todo respeito aos seus músicos, está em Mike Oldfield, que teve a coragem de perseguir um sonho e escreveu o álbum incrivelmente estranho, apesar de todos os riscos que o projeto levaria. Uma obra extremamente audaciosa.
Os primeiros segundos da faixa é sem dúvida alguma a parte mais conhecida pelas pessoas, porque a introdução repetitiva criou a atmosfera perfeita para o filme "O Exorcista". Um fato interessante e nem sempre observado é que não é literalmente uma repetição da mesma, é mais como variações sucessivas ao longo de um mesmo tema, porque cada vez que ele volta para o refrão original, ele acrescenta um novo instrumento ou um coro, tornando tudo um excelente arranjo que nos introduz ao incrível mundo de Oldfield.
Depois de algumas repetições, de repente, vem a explosão, do nada um solo de guitarra distorcida pega o ouvinte de surpresa, então tudo se torna muito complexo e é difícil acompanhar as mudanças radicais trazidas pela música.
Detalhar toda a canção é algo que não me julgo capacitado em fazer, mas um outro bom momento na primeira faixa é por volta do minuto 16, onde tudo fica mais estranho e em um clima depressivo, um excelente baixo dá início a seção final, quando Vivian Stanshall começa a anunciar um por um cada instrumento que é adicionado à equação até a faixa chegar ao clímax com os sinos tubulares, maneira simples e brilhante para fechar a primeira parte do álbum.
A segunda parte começa mais calma, serena, em um clima até mesmo pastoral, a música flui suavemente, Mike dando a chance de provar sua versatilidade em alguns instrumentos incomuns para o rock como uma gaita soando como guitarra, bandolim e glockenspiel, mas novamente ele tem algo totalmente inesperado reservado ao ouvinte.
Quando a faixa está por volta de 8 minutos, inicia-se uma maravilhosa dissonância e novamente do nada algumas vozes "assombram" a música antes da banda entrar, é chocante, mas ao mesmo tempo cheio de paixão, forte e dramático, mesmo se o ouvinte não tem a menor ideia mais aprofundada do que está sendo feito, ele irá se pegar preso na música, imaginando épicos do cinema, por exemplo.
Mas, novamente vem uma mudança radical, uma seção acalma tudo, sendo interrompido por explosões curtas de guitarras metálicas que nos prepara para o ainda mais inesperado final. Um quase clima barroco (impressionante como alguns artistas progressivos da época gostavam dessa linha musical) traz também solos de órgão. Em seu fim, a faixa traz "The Sailor's Hornpipe" (mais conhecido como o tema Popeye), soa um pouco estranho no contexto final do álbum após uma linda passagem de guitarra. Mas a realidade é diferente, originalmente esta seção foi ainda mais estranha, porque Vivian Stanshall fornecia uma narração em quadrinhos como guia de turismo mostrando o ouvinte todo o Manor House, onde o álbum foi gravado.
"Tubular Bells" é uma obra verdadeiramente grandiosa, arrojada e desafiadora, ainda mais quando tem na sua liderança um multi-instrumentista de apenas 19 anos e praticamente desconhecido. Um disco histórico que serviu como um excelente cartão de visita de Mike Oldfield para com o mundo da música.