Por Pedro Martins
Quem disse que é preciso lançar mão de acordes truncados e metáforas obscuras para se chegar à um disco de rock que transponha a fronteira entre o showbiz e as sutilezas do fazer artístico? Aos militantes desse culto ao incompreensível, recomendo uma boa dose do Travis e seu irresistível The Man Who. Nada de conjecturas filosóficas ou ponderações metafísicas: apenas o sentimento desvelado e sincero do sonhador que segue incansável na trilha de seu coração, inquieto por dizer, ou ainda cantar, as peripécias e desventuras dessa inusitada brincadeira chamada viver. Trata-se de um álbum que, certamente, não vira o mundo de ponta a cabeça - nem o pretende, vale dizer - mas que simplesmente convida o ouvinte a cantar e deixar-se encantar na sublime experiência de seus pouco mais de quarenta e cinco minutos.
Produto ambíguo de seu tempo, The Man Who é resultado da convivência harmônica entre as aspirações do mundo moderno e as pegadas da tradição sessentista, celebrada na forma da canção, há muito esquecida por contínuas gerações de bandas alinhadas à ideia de que bonito é fazer tudo de cabeça para baixo. Contrariando essa inclinação ao indecifrável, temos um compêndio de curtas peças musicais cuidadosamente concebidas em cada um de seus elementos: versos dotados do mais pungente lirismo trovadoresco, pontes arrebatadoras como stairways to heaven e refrões cativantes no melhor estilo preconizado por Lennon e McCartney.
Enfim, o retorno ao qual me refiro não é apenas bem-vindo, mas também oportuno. A simplicidade se torna em elegância através da poesia e o espírito arredio do rock se alia à terna sinceridade dos trovadores, tornando sublime a mais singela das experiências humanas. A canção, revisitada, inicia uma busca daquilo que se perdeu com o tempo e que fazia do rock um gênero atracado em lugares comuns. Dessa forma, o olhar para trás a que me refiro não é, nem de longe, um retrocesso, mas um meio de retomar a trilha perdida ao longo dos anos.
Assim fui apresentado ao Travis, e não poderia haver melhor cartão de visitas. Aliás, fico me perguntando quem é o tal homem mencionado no título do álbum, para o caso de trombar com ele por aí e poder cumprimentá-lo pelo ótimo trabalho.