Por Valdir Junior
A cantora e compositora Barbara Eugênia, é uma das grandes vozes femininas da nova geração de cantoras que surgiram nos últimos dez anos no Brasil. Seus dois discos,“Journal de BAD” (2010) e “É o que temos” (2013) são ótimos e mostram uma cantora que prima tanto pela qualidade de seu canto como das composições.Além disso, ela também participa de vários projetos musicais com Edgar Scandurra e o projeto musical “Les Provocateurs”, que presta homenagem ao cantor francês Serge Gainsbourg, e com os músicos Pupillo, Dengue e Rica Amabis para integrar o coletivo “3 na Massa”, entre outras participações e projetos musicais.
Um desses projetos é o duo “Aurora”, com ela e o guitarrista Chankas (Fernando Cappi, guitarrista da banda Hurtmold, que adota esse nome artístico nos trabalhos feitos fora do seu grupo), lançado agora em fevereiro de 2014 o seu álbum homônimo, com download gratuito no site: http://auroraaurora.bandcamp.com/. Gravado no fim de 2013 no estúdio El Rocha, e totalmente composto em inglês, o álbum é um deleite sonoro, explorando com inteligência e sensibilidade o lado mais folk da musica pop.
Notadamente inspirado na música dos Beatles, “Aurora” traz elementos e referências que remetem tanto ao legado musical dos Fab Four (inclusive de suas carreiras solos), quanto a de toda produção musical feita nas ultimas cinco décadas, junte a isso o fato de “Aurora” conseguir ao mesmo tempo soar “novo” e também sinalizar futuros caminhos a se percorrer na musica pop.
Logo já na primeira audição somos surpreendidos pela bela harmonização de vozes de Barbara e Chanka, elas se combinam de tal forma que uma terceira voz surge, uma voz que conduz, quase contando uma estória, faixa-a-faixa. Aliás, a temática das letras é outro ponto forte de “Aurora”, aqui as canções são declarações positivas de como enxergar “o lado bom da vida”, usando símbolos como cores, arco-íris, estrelas, arvores, citados aqui e ali nas letras, mesmo que em alguns momentos elas transpareça uma leve melancolia.
As nove músicas do álbum viajam como já dito pelo que de melhor já foi feito na música, aqui encontramos o country/folk de “Say Goodbye”, que lembra um pouco a parceria de Robert Plant com a cantora Alison Kraus; “With Love” e “ Dont Let it Slip Away” são canções pop na essência, aliás a duas faixas tem um “Q” de Paul McCartney da época do álbum “Wings Wild Life”, trazendo uma emoção latente no vocal que nos envolve a cada nota; “Why So Mute ?” mostra um improvável cruzamento da The Band com o John Lennon do álbum “Mind Games”, novamente mostrando os belos vocais de Barbara e Chankas que terminam num “quase” canto gregoriano.
“Stand Up For Yorself” tem uma introdução com sax barítono, tocado por Thomas Rohrer que nos remete ao Free Jazz / Avant-Garde de John Coltrane, e evolui para uma batida de marcha contagiante, cadenciada e bem “pra cima” e que gruda na nossa cabeça até o fim, ela é novamente entremeada com o tema a la Contrane. “Climb the Stars” e “And Love You’ll Have” trazem um pouco da psicodelia, ao álbum, a primeira tem uma levada meio Byrds e a segunda é quase uma canção perdida do Pink Floyd da época do “Obscured by Clouds”.
“Ants” é mais roqueira das faixas, se aproxima do som do The Black Keys , mas com um cuidado muito maior na melodia e nos vocais, fazendo a música crescer ainda mais. Fechando o álbum que, por enquanto, não tem ainda sua versão física (que espero que venha logo, tanto o CD como o vinil), temos a faixa título do álbum e do duo, “Aurora” é como um resumo de todas as faixas apresentadas e o trombone tocado por Gil Duarte e a guitarra solo de Davi Bernardo dão uma cara ainda mais beatle a ela, num clima bem “Abbey Road / Sgt.Pepper’s”.
“Aurora” já é um dos melhores lançamentos desse ano, e um bom exemplo de que se está fazendo boa, mas muito boa música nesta terra castigada com subprodutos musicais que são incensados nos meios de comunicação como se não existisse nada mais. Ainda bem que existem trabalhos como “Aurora”.