Por Anderson Nascimento
As badaladas do sino da igrejinha de uma cidade bucólica anunciam o nascimento de um novo dia, tendo como cenário as pracinhas pintadas com cal e aquele cheiro saudoso de quem já vivenciou a simplicidade de um dia comum no interior. É assim, de mansinho, que “Alma do Interior” abre o novo trabalho de Renato Novaes, a faixa é repleta de coros e vozes que ecoam as mais longínquas cidades de Minas Gerais.
“Canções do Fim de Tarde” tem o delicioso sabor de esquina, despretensioso (mas ciente de seu valor), com simplicidade e bom gosto. Ao longo dos seus onze momentos, o disco presenteia o ouvinte com lindos arranjos vocais, e um instrumental refinado, com presença de músicos da mais alta patente da MPB brasileira.
Quem ouvir o álbum na sequência vai perceber que há todo um arquétipo conceitual que inicia no alvorecer do dia, e perpassa por nasceres, indo de flores no chão do vulcão ao nascer de um peixe negro dentro d’agua que acaba se revelando “Bituca”, em uma explícita e merecida homenagem ao mestre que está prestes a completar 80 anos. Seguindo o seu rumo, como um rio manso, o disco acaba desaguando no surpreendente samba “Girei o Mundo”, petardo feroz desse belíssimo trabalho.
Dentre muitos momentos especiais, o disco traz “Valsa de Sant Andreu”, uma bonita canção que ganhou a luxuosa regência de Cristóvão Bastos. Também surpreende a faixa seguinte, “La Imensidad de La Luna”, outra valsa de pegada que lembra o Tango argentino, e que praticamente tem dois momentos, um mais lento e outro mais rápido. Aliás, vale ressaltar a diversidade sonora deste novo trabalho do artista, essencialmente MPBístico, mas que arrola valsa, tango, samba e bossa.
Falando em bossa, o Rio de Janeiro do artista é outro homenageado com “Um Janeiro Qualquer”. Já “Carinho Feito Pelas Mãos” é o melhor momento do álbum, além de letra cativante, a faixa vai crescendo progressivamente. Vale dizer que a canção tem tudo para ser trilha de novela, certamente seria incrível.
Em tempos em que a busca pela qualidade musical tornou-se um bom desafio, é muita sorte ser acertado em cheio por esta brilhante obra, de um jovem que está apenas no seu segundo trabalho.