Por Marcelo Teofilo
Desconstruindo, encanta-se.
Penso sempre o quanto é mais confortável percorrer as seguras vias do conformismo a aceitar que as nossas próprias sábias considerações, por mais vagas que sejam, sobre aquilo que somos capazes, tendem sempre a nos levar a caminhos inusitados e diversos. O medo é o que nos afasta das livres escolhas e que nos mantem conectados com a mesmice sem que consigamos uma nova porta abrir. Quase como se mergulhássemos por instantes na vã ignorância.
Subverter não consiste apenas em ser reacionário, revolucionário ou mesmo transgressor. Subverter significa entender que os sentimentos não só podem, como devem buscar novos caminhos. Novas nuances. Novos meios que façam surgir o sentido que advém da procura. Do anseio. E não de uma suposta coragem torta que mais soa previsível do que real. Do contrário, estaríamos fadados a constante banalidade. Estaríamos entregues a uma falsa coragem fruto de palavras soltas e descabidas. Desconexas, talvez.
Na contramão do que se vê por ai está a música produzida pelo pessoal do Meia Banda. Banda de amigos. Banda de gente que se gosta. De gente que gosta de experimentar. Banda de gente boa. Banda de gente que não tem medo de arriscar e ser feliz. Que dá uma banana (split) para todos os conformados e, inconformados que são sambam no ritmo da originalidade. Dançam os desafios e cantam uma nova melodia. Estabelecem uma nova conexão. Com a canção.
Bruno di Lullo, Domenico Lancelotti, Eduardo Manso e Estevão Casé fazem parte de uma marginalidade efervescente que permeia a atual cena musical brasileira. São o incômodo de alguns e a grata surpresa de outros. Como Arrigo Barnabé, Tom Zé e Jorge Mautner foram em outrora. Produzem como nunca música de qualidade. Produzem sem alarde, mas com tamanha emoção. Que bom. Triste seria se diferente fosse.
O álbum da Meia Banda traz dez faixas carregadas de experimentalismo e sensações. Não é disco que apenas se ouve, mas também que se sente. Percebe-se através das texturas nele dispostas. É um convite ao imaginário. Um convite aos sons nele deixados. Gravados com sutileza. Com timbres, efeitos e estranhezas que se completam estabelecendo um diálogo atemporal com a composição. Um disco que faz surgir o que um artista tem de melhor a oferecer que é a sua originalidade.
Uma das coisas mais interessantes desse trabalho é que ele bem poderia ser gravado como um álbum instrumental, justamente pela riqueza de detalhes, porém ele se torna irresistivelmente interessante pelo fato de que nele existem melodias, temas e letras que completam a sua beleza como em "Doce é o amor'.
É um álbum desafiador como sugere a introdução de "Rastro Aéreo" que aponta para uma direção, mas invoca o caminho contrário evitando o óbvio. Dessa forma, nada poderia ser mais adequado do que o convite feito a Ney Matogrosso para participar da faixa "Vespertina" mostrando que nesse disco não há espaço para o lugar comum. Com isso, a música torna-se ainda mais bela e especial. Impecável, porque não dizer.
O disco conta ainda com as participações não menos primorosas de Danilo Caymmi um dos grandes nomes da música popular brasileira e Dado Villa-Lobos que frequentemente está rompendo, no melhor sentido da palavra, com o estilo que o consagrou para transitar por novos caminhos. Novas possibilidades.
Esse disco é o resultado da união de grandes amigos. Do carinho, respeito, mas, sobretudo do desejo de compartilhar novas ideias e fazer dessas um permanente mecanismo de transformação pessoal e artístico.