Larc Nadelle é um dos novos artistas a lançar um disco de rap nacional em todas as plataformas digitais. Seu primeiro trabalho, Doce Anelo é uma sugestão que diz que a Black Music pode unir elementos: a batida, a rima e a crítica social com o lirismo, riqueza de instrumentos, a poesia, o amor romântico e até as boas viagens para os tempos de criança. Já ouvimos alguns exemplos parecidos em alguns trabalhos de Criolo, Gaspar, Sombra, Rael e até mesmo o projeto Boogie Naipe, do Mano Brown e do espiritualizado álbum Transmutação, de BNegão & Seletores de Frequência, em 2015.

Doce Anelo é um álbum que tem crítica social, mas também tem palavras rebuscadas, tem melodia, tem instrumentos musicais variados (até marimba!), tem lembranças, tem gosto de infância... Sim, a infância é muito valorizadas no álbum, desde a capa que mostra um Larc criança brincando de fazer música, passando pelo vocal de apoio da jovem Pietra Marques, filha de uma professora de música e de um amigo do rapper,pelo efeito de crianças brincando na rua na introdução da faixa título, até a letra de “Infância”.

O álbum contém nove músicas divididas entre as rimas do que eu considero um protesto pacífico, passa pelas memórias do próprio Larc em letra e ritmos e fecha com um toque romântico, moderno, digno de hits de verão, prazerosos de ouvir. As faixas de abertura “Livre Pra Sonhar” e “Igualdade” trazem elementos sonoros do Hip Hop e temas como desigualdade, racismo, educação e provocações aos alienados, mas sem incitar o ódio e a revolta. A trilogia fecha com a música “3Black”, que conta com a participação do produtor Nego Lock nos vocais, que incorpora os elementos clássicos do rap, enriquecendo o álbum não só no ritmo como agora na voz.

A metade de Doce Anelo chega com as músicas que eu considero mais ricas no trabalho de Larc: São compostas por rimas, efeitos e o vocal repleto de inocência e espontaneidade de Pietra em “Ser Um Passarinho”, pela referência anos 90 da nostálgica “Infância” - letra que já existia há bons anos, antes do projeto do disco ser idealizado - e a riquíssima faixa título “Doce Anelo”. Com a colaboração do músico Well Alves,o som conta com melodia, lirismo, pegada acústica, violão, timbre orquestrado e o ingrediente mais percebido:as memórias da família de Larc e a sensação da rápida passagem do tempo. A música tem tantos elementos que às vezes a sensação é que não dá tempo do ritmo acompanhar as rimas.

A partir daí, o álbum entra em uma pegada romântica, pop, R&B ( sim, tudo ao mesmo tempo) e some isso ao leve toque de música latina no instrumental de “Garota Atemporal”, lembrando aqueles hits que a gente ouve em luau no auge do verão (ou talvez seja apenas a minha saudade da praia!). Quando ouvimos “Olho Nos Seus Olhos”, percebemos que ela é mais swingada, tem um tom um pouco elitista (tipo trilha de produção audiovisual) e é leve, suave, de rimas fáceis e de palavras bem sacadas, que se encaixam perfeitamente não apenas pela fonética.

O álbum termina com “É Pra Você”: Alguns acham que é referência ao Sampa Crew, outros sentem mais o R&B ( eu fico com a segunda opção), mas na verdade o que importa é o show de vocal e rima que contam com o talkbox e sendo proposital ou não, nos traz um falsete.

E se em alguns momentos ao ouvir “Doce Anelo” a gente sente falta, por puro costume, de ouvir alguma batida que faça a parede tremer, sinto que a gente chega mais perto de entender a ideia e a beleza do trabalho que Larc Nadelle apresenta com a ousadia de ser sutil.Certa vez me disseram que chegaria uma galera nova que devolveria a harmonia e a melodia à uma arte que ultimamente muito chamava atenção apenas pelo ritmo. Talvez essa pessoa tenha razão, esse pessoal está chegando. E vale a pena prestar atenção neles. O que a gente ganha com isso? Talvez um pouco mais de amor, por favor! E me desculpem pelo clichê.