Por Flávio Marques.
No primeiro CD, Cida Airam, artista que mora em Curitiba há uma década, alça novos voos. Prestes a começar a turnê do primeiro trabalho para chamar de seu, Cida Airam, que debuta como compositora em álbum solo, concedeu uma entrevista exclusiva ao Galeria Musical.
Por que só aos 40 anos o primeiro álbum?
A minha trajetória como cantora foi marcada por encontros e desencontros musicais. Sempre busquei uma sonoridade minha, uma identidade que não me deixasse local, rotulada ou datada. Os estudos com vários professores de canto, a herança nordestina e a vinda para o sul me propiciaram as escolhas sem aquela sombra da dúvida. O primeiro CD aos 40 anos apresenta a minha verdade e todos os caminhos que trilhei como cantora. Eu não tinha o que dizer aos 20 anos. Já tinha o que cantar aos 30, mas me faltava grana para gravar. Agora, o universo reuniu todas as flechas do destino e tudo o que se ouve e se vê no CD é o meu fruto doce e maduro.
O que o o grupo Vocal Brasileirão acrescentou a sua vida e trabalho?
O grupo Vocal Brasileirão me apresentou a cidade de Curitiba, quando cheguei em 2005, me fez experimentar outros repertórios da música brasileira, amadureceu minha percepção musical, aumentou minha extensão vocal e eu pude dividir o mesmo palco com vários artistas nacionais, como Joyce, Ivan Lins, Quarteto em Cy, Boca Livre, Sá e Guarabira e me fez equilibrar o meu cantar visceral e elegante.
Uma coisa interessante na sua trajetória: você trocou Natal (RN) por Curitiba (PR), quando é mais comum as cantoras migrarem para São Paulo (SP) ou Rio de Janeiro (RJ). Nunca pensou nisso?
Interessante mesmo, porque, ainda morando em Natal, eu já sabia que não iria pra SP ou RJ. A minha peregrinação musical não passaria por esses eixos. Minha intuição sempre me guiou. Meu caminho para fazer música tinha que passar pela verdade. Sempre cantei o que eu acreditei e o que eu achava que era necessário para meu crescimento, mesmo indo contra a maré do mercado fonográfico. Vim para Curitiba cantar música celta com um grupo chamado Keltoi ( isso era minha verdade na época ), mas a música brasileira gritou mais alto. Entrei no grupo Vocal Brasileirão e voltei a misturar minhas experiências musicais.
Gosto muito de misturar timbres, intenções, palavras, o doce e o salgado, o melancólico com o ritmo pulsante. Aprendi na vida que é preciso viver o luto por um tempo curto e depois sair dele mais forte, mais vibrante e disposto para vida. O meu CD tem tudo isso. Ouça a ciranda Flor das Águas e sinta isso: o ritmo pulsante e a melancolia da melodia e a saudade na letra. A mesma coisa acontece com Memória, um carimbó com a dramaticidade da interpretação. É o meu lado lusitano. Ou na música Solitária a bipolaridade do clima curitibano. Hahahahaha!
O que a direção musical e os arranjos de Luís Otávio acrescentaram ao seu CD?
Luís Otávio Almeida foi um grande encontro musical. Ele conhece muito sobre os ritmos brasileiros e mergulhou no meu trabalho com paixão e dedicação. Foi o produtor e o arranjador ideal para a sonoridade do CD. Muita Gratidão a ele e a todos os músicos envolvidos nesse trabalho.
Quais as dificuldades de fazer música na capital do Paraná? Já deu vontade de desistir?
Nunca deu vontade de desistir da música em Curitiba. É uma cidade com uma pluralidade de gêneros musicais incrível, mesmo não estando na rota das grandes capitais brasileiras. Curitiba ferve de trabalhos autorais maravilhosos, com personalidade e irreverência, mas sofre com as marés altas e baixas desse mercado musical brasileiro. Os artistas também ficam dependendo de editais de cultura, mas também é necessário que nós, artistas da cena musical, saquemos mais sobre as políticas culturais da cidade para podermos ter argumentos concretos sobre a ação cultural da FCC e de outras iniciativas culturais.
Na primeira faixa desse trabalho, surge um rap da Janine Mathias. Confesso o seguinte: nunca tinha imaginado o nordeste com tal estilo. Como surgiu tudo isso?
Janine Mathias é uma grande descoberta em Curitiba. Ela passeia pela MPB, samba e rap com propriedade e tem um timbre e uma desenvoltura vocal bem particular. Quando ouvi a música Aparelho de Memoriar, da alagoana Patrícia Polayne, pensei na hora em fazer essa mistura e com duas mulheres cantando: um coco e um rap. Essa mistura dos ritmos não é nova (a embolada, o coco e o rap conversam entre si), mas duas mulheres cantando, é muito novo! Ficou demais!
Ouvindo todas as faixas do disco, percebi que a sua verdade pulsa alto. Como é não parecer, nem um pouco, com o exército de cantoras genéricas que assola o Brasil?
Eu adoro não estar no mesmo pacote genérico das cantoras. Quando eu morava em Natal, ouvi de um músico, dono de bar: “sua voz é estranha. Você tem um jeito diferente de cantar e o público não entende muito”. No momento que ouvi esse depoimento e estava perdendo o trampo, senti medo, mas, ao mesmo tempo, senti que estava no caminho certo. Que seria árduo, mas seria um caminho só meu, com minha verdade e que não iria agradar a todos. Mas é claro que eu queria e quero ser ouvida e compreendida por todos, porém, não como uma cópia ou como mais uma voz na multidão. Hoje eu tenho liberdade para cantar e usar a minha voz do jeito que eu quiser, porque estudei, porque sei o que estou fazendo e assumo as responsabilidades das minhas escolhas. Só me atrevo a cantar o que sei.
Li no seu release que o primeiro show é agora, no sábado, dia 24 de outubro. O que o público verá? Como serão os shows?
Quero que o público sinta minha música nos pés e no coração. Quero que seus ouvidos estejam atentos para encher o coração de alegria e paixão. Vai ser uma noite de festa.
Esse primeiro show terá a participação especial da Janine Mathias e do Gusta Proença. A banda que vai me acompanhar será formada pelos músicos: Luís Otávio na guitarra; Sandro Guaraná no contrabaixo; Thales Lemos na bateria; Carlos Ferraz na percussão e Alonso Figueroa no teclado e sanfona.